terça-feira, 12 de setembro de 2017

Capítulo 7 - Desligamento
As aulas práticas foram realmente muito importantes. Flor Azul se ajuntou a nós, como sempre muito
simpático, e trabalhou bastante. 


Primeiramente fomos a hospitais de encarnados da região. Por mais que estudemos, ao ver pessoalmente a tarefa é diferente, por entrar a emoção e, às vezes, a piedade.

Também, porque é com a desencarnação que encontramos os amigos ou os inimigos que fizemos, quando encarnados.

Vimos primeiramente a desencarnação de um senhor que a equipe socorrista veio desligar; esperavam-no muitos amigos e familiares.


Desencarnou tranqüilo. Foi bonito. Mas logo em seguida vimos a desencarnação de outro senhor, que
muitos obsessores aguardavam. Oramos por ele, mas não conseguimos impedir que os obsessores o
desligassem e o levassem, certamente, para o Umbral.


D. Isaura aproveitou para elucidar-nos:


- Estamos aqui para um aprendizado, auxiliando todos os que fizeram jus a uma ajuda dos bons. Não
podemos interferir na colheita de ninguém. Esse senhor vibrou com os inferiores e não conosco; a vida toda afinou-se com eles, com esses irmãos das trevas, e só pode ter agora a companhia que ele mesmo escolheu.


Ao cometer erros, estamos vibrando com os errados. Este senhor precisa sofrer, para aprender.


O sofrimento é o remédio de que necessita.

Vimos muitas desencarnações. Em hospitais grandes acontecem muitas. Ajudamos os socorristas nos
desligamentos de muitos deles.


Onde íamos, apresentávamo-nos, ao chegar, aos responsáveis do local. Fomos sempre bem recebidos e estivemos em muitos hospitais.


Desligamentos de crianças são rápidos.


Normalmente, quando estão para desencarnar, uma equipe de socorristas já está perto, e sempre são levadas para um socorro.

Impressionei-me porque criança sempre me comove, mas é mais fácil, não são normalmente tão
presas à matéria como os adultos.


Depois, ficamos de plantão nas rodovias de maior movimento. Nas grandes rodovias há, em
determinados pontos, pequenos Postos de Socorro e, ao mais simples acidente, é acionado um aparelho, indicando o local e a gravidade. A equipe de socorro vai em seguida, chegando mesmo antes do socorro material. Fomos recebidos com alegria pelos trabalhadores. Torci para que não houvesse nenhum acidente, mas houve vários. Os Postos de Socorro nas rodovias estão sempre em contato e, assim, quando acontecia um acidente, logo nos era comunicado e íamos imediatamente para o local. 


Não é agradável ver pessoas machucadas e com dores. Ajudamos tanto os feridos, como os que desencarnaram. O desligamento nos acidentes às vezes é violento, pois o corpo morre e o perispírito se desliga instantaneamente. Levamos muitos espíritos para o Posto de Socorro da rodovia. Ali recebem os primeiros socorros, logo depois são levados para outros Postos de Socorro.

Muitas vezes é feito somente o desligamento sem socorrer o espírito. Há desligamentos que demoram
pouco tempo. Outros são feitos aos poucos, levando horas.


Depois de muitas horas nas rodovias, onde vimos muitos acidentes com mortes e muitos machucados,
fomos para o cemitério.


- Aqui existem muitos apegados ao corpo físico, nosso trabalho de aprendizagem consiste em ajudar,
desligando todos os que pudermos.


Eram muitos os que gemiam ao lado dos corpos apodrecendo; outros dormiam em pesadelos. Os
trabalhadores da equipe de socorristas do cemitério vieram nos receber contentes:


- Bem-vindos, os do grupo de estudantes! A presença de vocês nos é muito grata. Sempre que aqui vêm, conseguem ajudar muitos irmãos que não souberam desencarnar e sofrem.


Espíritos vagabundos, arruaceiros, gostam de zanzar pelos cemitérios, mexem com os que sofrem e riem dos que se julgam encarnados. Tivemos recomendações para ignorá-los. Durante nosso trabalho, ficaram nos observando, chegaram a nos ironizar, mas sem se aproximar.


No cemitério, havia muitos ligados ao corpo morto.


- São tantos! - Exclamou Zé. -Aposto que vamos conseguir levar a metade para o socorro.


Aposto que ficarão somente dez - disse Luís. - Ficam três - eu disse.


O grupo é alegre, não se pode abaixar a vibração com tristezas e piedade sem ajuda. Falamos por
brincadeira.


Desejávamos que não ficasse nenhum sem socorro. 


Repito que poderíamos ajudar somente os que
pedissem com humildade, sinceridade, e os que estavam a fim de socorro, mas não os revoltados, que blasfemavam. Estes são muito necessitados, mas não adianta levá-los para um socorro, porque não aceitam e só trazem problemas para o local para onde são levados.


E lá fomos nós, todos animados, tentar conversar com eles. Não é fácil!


Nos que dormiam demos passes, mentalizando nossas forças para ver se conseguíamos despertá-los, acalmá-los e fazer que pensassem em Jesus, em Deus.


Três dos que dormiam despertaram apavorados e, assim que os desligamos, saíram correndo.


Certamente seriam socorridos mais tarde. Os que gemiam estavam perturbados pela dor e pelo horror de estarem ali; dávamos o passe e pedíamos que ficassem calmos. Pudemos desligar muitos, socorrendo-os e levando-os ao Posto de Socorro. 


Em quase todos os cemitérios há um Posto pequeno, para onde os socorristas levam, por pouco tempo, os socorridos.

Alguns repeliam nosso socorro, chegando a nos xingar. A eles nada pudemos fazer.


Para mim, esse trabalho é delicado, e admiro os que o fazem. Não é fácil ver muitas tristezas. A
vontade que me deu foi de socorrer todos, mas não é possível e, por isso, ficaram muitos ali presos a seus corpos em decomposição. Mas nosso trabalho deu resultado, porque os poucos que socorremos nos encheram de alegria.


Admiro os socorristas dos cemitérios.


Quase todos moram no pequeno Posto, trabalham muito, têm pouca folga e são felizes. Amam o que
fazem.


- Pensei que ia me sujar ao lidar com tantos irmãos sujos, uns até apodrecendo - falou Luíza com
sinceridade.


Frederico respondeu:


- Não, Luíza, nós não nos sujamos. Depois, sabemos plasmar limpeza, limpar-nos pela força da
mente. De fato, em sua maioria, os irmãos que sofrem, aqui, estão sujos, mas devemos ver os irmãos que sofrem e pensar que talvez pudéssemos ser um deles. A sujeira externa não é obstáculo ao socorro.


Fomos ver alguns velórios. Sempre uma nuvem cinzenta de tristeza e agonia paira sobre o local.


Vimos alguns em que apenas velavam o corpo, com o espírito já desligado, ausente.


Mas em alguns velórios o espírito ali estava, confuso. Em outros, dormiam junto ao corpo. O que
atrapalha nesses lugares é a choradeira. Que bom seria se todos entendessem a desencarnação como ela é e aceitassem essa ausência física, ajudando o desencarnado com pensamentos de carinho, orando com fé, auxiliando no desligamento e na sua ida para o plano espiritual!


Raimundo foi com Joaquim tratar, em outro local, de um caso particular. Teríamos duas horas para
ficar na crosta e fazer o que quiséssemos. Quase todos seguiram D. Isaura, que quis retornar ao cemitério.


Era noite, convidei a turma para ir a minha casa terrena. Alguns aceitaram, Frederico nos acompanhou.


Fomos em sete.


Entramos em casa e acomodamo-nos na sala de televisão. Sempre me emociono ao entrar no meu exlar terreno. Sentir os fluidos dos familiares, o calor humano, o carinho com que sou lembrada, é bem agradável.


Começamos a conversar. Meus familiares dormiam.
A conversa esquentou, Zé acabou fazendo um barulho físico na televisão. Aquietamos na hora. 


Meus pais acordaram, vieram ver o que tinha feito barulho. Não vendo nada, logo voltaram a dormir. 

Zé, sério, falou dirigindo-se a nós:

- Respeitem a casa de Patrícia, suas assombrações de meia importância.


Foi só risada.


Zé costuma dizer que não somos tão pés-de-chinelo e nem importantes. Somos somente meio... 


Frederico nos explicou que foi possível fazer o barulho, Porque havia alguém sensitivo em casa e por estarmos distraídos a conversar. Pediu ao Zé com delicadeza que não fizesse mais esse tipo de brincadeiras.

Ele entendeu e se desculpou.


No horário marcado, pegamos o aerobus, que estava em um Posto de Socorro, e voltamos à Colônia.


Na aula de conclusão, todos quisemos falar. Os socorristas dos cemitérios foram nossos heróis.


- Tive vontade de desligar todos os que vi, ainda ligados ao Corpo morto - disse Terezinha. - Será que não poderíamos mesmo ter feito isso?


- Se tivéssemos desligado todos, não teríamos agido com sabedoria - respondeu D. Isaura. - Quando
fazemos algo prematuramente, resulta quase sempre em prejuízo ao socorrido. Todos os doentes necessitam da medicação certa.


- Vimos também familiares desligando entes queridos, sem a Presença dos socorristas.


Não pensei que isso fosse Possível - falou Marcela.


- Vocês agora sabem, e quem sabe pode fazer, desde que tenha permissão. Vocês viram familiares
desligarem seus entes queridos, mas somente os que já Podiam ser socorridos; os outros, ou seja, os que não têm merecimento, os familiares não podem socorrer.


- Vimos também os obsessores desligarem aquele senhor. Pensei que só os bons soubessem - disse
Luís.


- Saber não é Privilégio só das pessoas boas. Os maus sabem isso e muito mais coisas. Desligam, sim, e fazem isso com companheiros e com os que odeiam.


- Espíritos maus podem fazer desencarnar uma pessoa? Ivo indagou.


- Não. Nem os maus, nem os bons. Só podem desligar. E desligam quando O corpo já está morto.


 A morte do corpo segue a lei natural. Pode um encarnado matar outro encarnado. Mas não pode o desencarnado matar o corpo de um encarnado. 

Tanto os bons quanto os maus têm que esperar o corpo físico morrer para desligar o perispírito.

-Já desencarnamos tantas vezes, e cada vez nos parece algo fenomenal. Por que isto? - Glória
indagou.


- Falta de educação sobre a desencarnação, falta de entendimento certo. Entre os encarnados, é o
Espiritismo que dá a compreensão da desencarnação. Também nem sempre se vive encarnado como se deve, com a consciência tranqüila, e a morte, esta desconhecida de muitos, acaba provocando o pânico.


- Existe quem conhece bem a desencarnação e consegue desligar-se sozinho? - Indaguei.


- São casos raros, mas conseguem sim. Quem sabe, para si sabe.


Fiquei duplamente contente, pensei na minha família; certamente, se continuassem a estudar como fazem, não ficariam presos ao corpo morto, e depois, agora eu sabia, aprendi para ajudar.


A desencarnação foi realmente um assunto interessante!

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