segunda-feira, 11 de setembro de 2017

Capítulo 15 - Conhecendo Mais O Umbral

Não precisávamos ir em silêncio no caminho para o Posto Vigília, mas conversávamos só o
necessário; não dava vontade de falar, permanecíamos concentrados observando tudo.


O caminho não é fácil, íamos próximos um do outro, prestando atenção onde pisávamos. Na aula
teórica, estudamos o caminho no mapa e já tínhamos passado por ali quando fomos visitar o Posto Vigília.


Mas necessitávamos de experiência, para não nos perdermos por aquele caminho cheio de curvas. 


Quanto mais andávamos, mais escuro ficava. Fomos socorrendo os irmãos que encontrávamos. Eram os caídos na lama, os que se arrastavam pelo solo.

Apiedamo-nos de todos. Alguns, mesmo sofrendo, ao nos ver, insultavam-nos aos gritos:

- Que fazem aqui? Não têm nada de andar por aqui observando. Vão embora!


Muitos falavam palavras obscenas. Grupos de arruaceiros fogem quase sempre das equipes de
socorro.


Encontramos por duas vezes grupos assim, que fugiram escandalosamente fazendo algazarra. Os mais inteligentes param e observam somente, não insultam, ficam em silêncio. Os valentões, que gostam de brigas, enfrentam os grupos de socorro, mas, aos primeiros impactos dos lança-raios, correm aos gritos, insultando.


Acolhemos, no caminho, vinte e três sofredores e os levamos ao Posto. Uns iam amparados, outros,
nas macas.


Desses vinte e três, ao chegarmos ao Posto, cinco disseram não querer ficar. Mas, antes de deixá-los
partir, foram por nós limpos e vestidos; nos feridos, fizemos curativos, foram alimentados, e aí os deixamos ir embora. Os dezoito restantes foram limpos e encaminhados às enfermarias.


Um fato interessante: um dos que não ficaram, embora limpo e alimentado, nós o encontramos dias
depois, reconhecendo-o pela roupa, estava com um grupo que nos insultou.


Chegávamos sempre ao Posto cansados e, após nos limparmos e alimentarmos, íamos ouvir música e
conversar.


Não trabalhávamos no Posto, só os instrutores o faziam.


Vimos uma grande tempestade, certo dia, ao conhecermos o Umbral, perto do Vigília. Foi de
amedrontar. Raios cortavam o local com enormes clarões. Grupos corriam, assustados, de um local para outro sem saber para onde ir. Muitos chegaram perto de nós, mas, quando a tempestade se acalmou, saíram a correr.


- Não há perigo um raio cair sobre alguém? 


- Indagou Lauro a Frederico.

- Não. Os raios não fazem estragos. Queimam os fluidos deletérios. Nossas capas nos protegem deles.


Mas, se cair sobre um dos que vagam, receberá a carga elétrica que o fará perder os sentidos, já que não pode desencarnar novamente. (As tempestades ocorrem no Umbral como ocorrem na Terra. Se aqui podemos por aparelhos prever, nos Postos de Socorro também. Não são mandadas pelo Plano Maior, mas podem ser, às vezes, por necessidade.


As tempestades fazem parte do dia-a-dia do Umbral. – Nota do Autor Espiritual)

A vontade que dá, ao andar pelo Umbral, é de socorrer a todos. Mas frutos verdes não se aproveitam.


Nem todos querem auxílio dos bons. Não é possível levar os que não querem, seriam prejudiciais aos Postos e às Colônias. Quando almejarem com sinceridade pela ajuda, terão sempre quem os auxilie.


Entramos num buraco. Colocamos nossas lanternas na testa e descemos com cordas, que amarramos a
um aparelho que enfincamos no solo. Descemos todos, só Raimundo ficou lá em cima. Depois de minutos, encontramos uma encosta grande com cerca de dez metros. Ali estavam espíritos, que correram aflitos ao nosso encontro, a nos pedir socorro.


Organizamos para que subissem. Eram oito. Cinco conseguiram ir sozinhos, um necessitou que um dos trabalhadores do Posto o colocasse nas costas. Dois, inconscientes, tiveram que ir de maca, que prendemos às cordas e alçamos. Lá em cima, Raimundo conversava com eles, explicando como seria o socorro e que, se quisessem, poderiam ir embora. Só os inconscientes eram levados sem perguntar. Muitos ficavam conosco, mas a maioria ia embora quase sempre, sem sequer agradecer.

Continuamos a descer e paramos numa gruta. A escuridão era total. Entramos, não era grande, havia
ali seis espíritos, sendo que três pediram para ficar.


Estranhamos. Todos indagaram:

- Por quê?


D. Isaura simplesmente respondeu: - Gostam. Cada um deve ter seu motivo para não querer sair daqui.


Continuamos a descer, chegamos ao final. Era uma vala e ali estavam três espíritos presos com
cordas; nós os soltamos.


- Quem os prendeu? Por quê? - Quis saber James.


Dois amaldiçoavam seus algozes e nos pediram em nome de Deus que os castigássemos. O terceiro
ficou calado.


D. Isaura respondeu:


- Por isso estão aqui, por amaldiçoar. E, certamente, por brigas. Podemos soltá-los, levá-los para cima, mas não para o Posto. Voltando ao que estava quieto, D. Isaura indagou:


- E você, não quer se vingar?


- Não, senhora, quero ir com vocês. Sofro e estou cansado.


- Covarde! - Disse um dos dois.


- Você irá conosco - disse nossa instrutora.


Nessa excursão vimos outros fatos assim. Ao serem socorridos, pediam-nos que os vingássemos, que
prendêssemos ali seus algozes.


Subimos de volta, o buraco era fundo, achei um horror e sabia que era um dos pequenos.


Naquela noite, Flor Azul ficou um pouco conosco, falou que na China o Umbral é mais assustador e
há lugares tão fechados que raramente os socorristas vão até lá.


Um socorrista do Posto nos esclareceu:


- Esses que libertamos do buraco e não vieram conosco logo estarão envolvidos em novas confusões e, muitas vezes, serão presos novamente.


Só em excursões de estudos é que são soltos; nas que fazemos diariamente Vamos só até os que clamam por ajuda.

No outro dia, entramos numa grande caverna. 


Amarramos cordas na cintura para não nos perdermos.

Não entramos nos locais mais baixos. Trouxemos para fora muitos espíritos, mas socorremos poucos.


Fomos ver alguns núcleos de perto. São todos mais ou menos iguais: localidades pequenas, com
poucas casas agrupadas. São movimentados. Há alguns fechados por altos muros. Não entramos em nenhum.


Nesse dia, Artur veio fazer-nos companhia. Artur é o companheiro desencarnado do trabalho de meu pai.


Gosto muito dele.


Alegre, risonho, cumprimentou-nos sorrindo e disse que ia nos acompanhar pela excursão no Umbral.


Alegramo-nos.


Num local cheio de pedras, ouvimos barulho de um grande bando se aproximando. Reunimo-nos em
círculo. Flor Azul ficou ao meu lado e cada instrutor também perto. Um grupo grande, de uns trezentos moradores do Umbral, parou a nossa frente. 


Aquietaram-se e um deles falou:

- É aí que está a filha do feiticeiro José Carlos?


Já ouvira espíritos se referirem assim com desprezo ao meu pai, chamando-o de feiticeiro.


Artur adiantou-se dando alguns passos e parou diante deles, cruzou os braços no peito e respondeu:


- Está, por quê?


De sua mente saíram fachos de luz que os atingiram em cheio. Por segundos ficaram recebendo os
raios de luz, depois, assustados, debandaram em gritos. Artur voltou ao nosso grupo tranqüilo:


- Continuamos?


Todos estávamos curiosos e o rodeamos perguntando:


- Que aconteceu? - Muitos perguntaram de uma vez.
- Soubemos que iriam atacá-los e vim para ajudá-los - respondeu Artur, tranqüilo como sempre.


- Queriam a Patrícia? - Perguntou Nair, assustada.


- Pretendiam somente assustá-la.


- Por quê? - Indagou Ivo.


- O pai de Patrícia é um orientador espírita e incomoda os ociosos, os que por determinado tempo preferem o caminho do erro. Pensaram que poderiam assustar a filha, porém esqueceram que os encarnados que trabalham no bem têm os desencarnados bons a ajudá-los.


- Eles voltarão? - Luíza perguntou.


- Não creio. Mas continuarei com vocês até o final do estudo do Umbral. - Você se assustou, Patrícia? - Indagou Zé.


- Não, senti-me tranqüila como sempre - disse, olhando para Flor Azul.


Como não confiar, tendo a companhia dos três instrutores, de Flor Azul e Artur? De fato, Artur nos presenteou com sua presença nas excursões que fizemos ao Umbral, só não ficava no Posto. Estava sempre calado e conversava quando interrogado, sendo agradável com todos. Artur é simples, ninguém adivinha do que é capaz.


Por isso o admiramos e lhe ficamos gratos.


Os samaritanos saíram conosco. Eles conhecem o Umbral melhor do que seus moradores. É agradável
sair com eles. Levaram-nos ao pântano número dois, assim chamado por ser uma região de muita lama. O lugar é de difícil acesso, tem que se descer muito e há muitos abismos. Fomos descendo e socorrendo irmãos necessitados, mas somente alguns deles iriam para o Posto, a maioria somente seria tirada dali. O lugar é feio, muita lama, pouca vegetação, escuro e fétido.


Para voltar, já era tarde, logo seria noite, Frederico, D. Isaura e Raimundo uniram-se em pensamento e fizeram uma passarela de luz. É linda! 

Maravilhosa! É uma estrada inclinada de luz amarelada.

Fomos andando sobre ela. Estranho e fenomenal. É como andar no solo. Depois de andar por horas
em solo acidentado era agradável caminhar pela passarela. Os três instrutores iam na frente e formando a passarela a dois metros na frente deles. íamos atrás com os socorridos e, à medida que passávamos, a passarela ia sumindo.


Tínhamos que ajudar a sustentá-la com pensamentos bons. Fomos cantando. Logo estávamos em solo
firme e perto do Posto Vigília. De longe, a passarela, embora amarelo-clara, parecia um arco-íris.


No dia seguinte, Raimundo pediu permissão ao chefe da cidade do Umbral para entrarmos e vê-la. 


O governador - assim é chamado - deu permissão, mas avisou que seríamos vigiados.

Naturalmente, vimos somente algumas partes, não conhecemos as prisões, os lugares de torturas e
nem entramos nas casas dos moradores. Visitamos o salão de festa, todo roxo e amarelo-forte, com desenhos em preto. Nas paredes há desenhos de dragões, figuras satânicas, parecidas com as que os encarnados desenham, do diabo.


Enfeitam também o local algumas cortinas amarelas e vermelhas em tom forte. Não há flores nem
plantas. Havia pelo local algumas cadeiras. Depois fomos à sala de audiência, é de dar medo. Toda preta, com enfeites dourados e prateados. Tinha muitas cadeiras, todas pretas e em ordem. Não estava nada sujo.


Também fomos à biblioteca, é grande, contendo muitas revistas e livros sobre sexo, muitas cópias que os encarnados possuem. Não são bagunçados. Estão em estantes e há até quem cuide dos livros e revistas.


Fiquei o tempo todo perto de Artur, que pouco conversou. Éramos visitas e nos foi recomendado
evitar comentários. Andamos pelas ruas, na ocasião estavam razoavelmente limpas. As ruas são curvas e de pedras.


Já era hora de irmos embora, Raimundo agradeceu a acolhida. Não teve resposta, pois julgam-se
importantes. Ao sairmos, dois guardas vieram nos olhar, para ver se não levávamos ninguém da cidade. Não socorremos ninguém nem vimos ninguém para socorrer. Pudemos olhar só os moradores, que fizeram de tudo para nos mostrar o quanto eram felizes. Mas não são, pois sua alegria é falsa. Ninguém é tão feliz, no termo certo, longe, distante do Pai, de Deus.


Raimundo nos explicou que nem sempre são permitidas estas visitas e que, sem autorização, nenhuma excursão entra na cidade. E que os escravos e torturados ficam escondidos nessas oportunidades. 


Entretanto, quando os socorristas querem, entram sem ser notados e socorrem aqueles que estão a clamar auxílio.

Agradecemos aos samaritanos, a Artur e ao pessoal do Posto Vigília. Despedimo-nos alegres, a
excursão terminava. Partimos para o abrigo e dele para a Colônia.


Na Colônia, recebemos oito horas livres. Fui ver vovó e os amigos. É tão bom revê-los!


Depois tivemos a aula de conclusão. Não se tinha muito que perguntar. Somente James perguntou a
Raimundo:


- Por que muitos que sofrem ficam pelos vales e buracos e não nas cidades deles?


- Porque, nas cidades, não querem os que sofrem, os perturbados nem os inconscientes, porque não
servem para nada. Ficamos todos consternados em ver o Umbral. Mas agora sabíamos andar por ele, ir a um socorro.


Fizemos no final da aula uma prece pelos que vivem lá e agradecemos por não estarmos nele.
Felizes os que tudo fazem, esforçam-se por vibrar no bem. Felizes os que, ao desencarnar, têm por
merecimento um lugar de bem-aventurança. Felizes os que seguem os ensinamentos de Jesus; os que
aprendem, encarnados, o que é desencarnar e mudam interiormente para melhor. Esses não terão o Umbral por moradia.

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